Quando
os dias sufocavam e ainda as férias não iam a meio, surgiu a proposta. Um amigo
da escola convidava Jaime para a casa que os pais possuíam na costa alentejana.
Cioso do filho, Formosinho encarara o pedido quase como ofensa e dispunha-se a
contrariá-lo. Queria tê-lo por perto, despertar nele o amor antigo aos trilhos
de estevas e cardos, senti-lo comprazer nos cheiros da erva rasteira a
despontar da quentura endurecida dos torrões, na lassidão do corpo em horas de labareda,
a linha recta das vinhas a perder de vista e o olhar a despir-se de argúcia e enchendo-se
de ternura à vista das cegonhitas novas, um niquinho de redondos aos assomos fora
do ninho. E, mais que tudo, a convicção de que as melhoras da mulher bebiam da
energia e saúde do filho. Mas não contara com a firmeza de Veridiana. Ao invés
do que esperava, a mulher fincou pés no convite. Incentivava o filho a partir, que era bom
fazer praia, que lhe fariam bem outros ares, que o iodo assim e assado, que a
diferença só traria benefícios. Que não se prendesse, ela melhorava, e a saúde,
já se sabe, vai-se num ai mas demora a voltar; que, entretanto, ele tinha de se
divertir com gente da sua idade. E, a sós com Formosinho, pespontava motivos, o
rapaz precisava acrescentar as amizades e conhecer outra diversão que pedalar sozinho
campos fora, não era bicho do mato. E porque torna e porque deixa. A Jaime,
desinteressado de vinhas e cegonhas, prendia-o apenas certo temor pela saúde materna,
a palidez sempre presente, a fraqueza que pressentia em repentes de recaída e
que ela dominava de pronto. Mas, na evidência da bênção, umas semanas de praia
eram paraíso inesperado. Abraçava-a pedindo, promete que comes e repousas,
promete. E ela prometia sorrindo, vai descansado. Quando tornes a buscar as
tuas coisas para a escola, estou quase boa. Ajeitava-lhe a melena rebelde com
mal disfarçado orgulho e acrescentava mirando a definição do rosto amado, melhoro só de pensar que estás
onde o teu gosto pede, filho. E acrescentava num sorriso doce e conivente, vais
conhecer raparigas e admirá-las em fato de banho, aproveita a sorte. Jaime
corava pouco à vontade e a mãe, uma palmadinha amistosa na face, cada idade faz
os seus pedidos e tem os seus gostos, meu filho.
Entretanto,
Celestina fazia a mala de Jaime e punha-se do lado do patrão. Chegava a casa e repontava
em desvelos de enlevo, tão malzinha que está ainda, e só pensa no bem do filho;
e então o rapaz não era para ver isto. Fazia uma pausa como que a dar tempo
para também o seu homem pensar no assunto e retomava noutra direcção, metido
dentro de casa de outros, que vai fazer para praias, sabemos lá quem são,
aquilo é gente que nunca se viu por estas bandas e que ainda desencabecina o rapaz.
Aborrecendo o tema, o marido aconselhava, deixa-te disso mulher, mania de te
meteres na vida de cada um. Pois se à mãe não lhe importa, para que te estás tu
a moer. E ela, pé firme na sua
convicção, não se importa, não se importa….eu é que a conheço, não és tu. Rodava
o corpo e dava meia volta. Assunto encerrado.