Tens
razão, não terminei a nossa última conversa. Nada tenho a meu favor excepto que
a vida às vezes me emudece e a minha Páscoa
é dada a movimentações trabalhosas. Faltou tempo e, sobretudo, ânimo. E portanto, já sabes, não renasci nem
coisa nenhuma. Ressurreições, zero. Para que saibas, ontem até me atrasei para
a “lição” semanal que desta vez coube ao
padre Adelino Ascenso (que nome, santo deus). Pior que isso, estava num cansaço
tão extremo que fui adormecendo aos bocadinhos e pouco me lembro do que disse o
especialista em Shusako Endo sobre o livro, “O Silêncio”que, aliás, também não
li. Mais nítido que as palavras, a sobrepôr-se majestoso, esteve o sofrido
esforço de manter olhos abertos enquanto, para minha desdita, não parava de
bocejar. Tudo causa minha, o Ascenso não teve parte, garanto: é inocente.
Digamos que do texto lido me ficaram uma ou duas ideias; as restantes não me
entraram. Escorregaram-me canseira abaixo. E, desculpa, mas nem te consigo
dizer se Adelino Ascenso me agradou. Deixo-o no limbo da minha ignorância
sonâmbula.
Digo-te
que tentei ver por duas ou três vezes o filme “O Silêncio” e desisti. Não volto
a tentar. Disse o emérito sábio que o livro é bastante melhor e mais reflexivo.
Duvido que o queira ler alguma vez. Parece-me que quem gostou do filme há-de
gostar ainda mais do livro. Mas só me parece. Diz-me tu se é assim.
Não
te esqueças de vir encerrar as lições. Prometeste. Podes vir fora de horas, a
gente compreende e vai ouvir-te na mesma. Mas não te esqueças de vir, ok? E começa,
se faz favor, a preparar a mala.